Não morri.
Aprendi a falar isso. Ou melhor: pois é, sumi mesmo. Não sei bem ao certo qual eu mais uso. O negócio é que quando você encontra pessoas que não vê a muito tempo, parece que colocamos desculpas para o nosso desaparecimento. Desculpas desnecessárias, claro. Por que é que eu tenho que me desculpar, ou arranjar desculpas por ter sumido por 7 meses porque estava no Canadá? Reflexões múltiplas e desnecessárias, afinal, a gente segue a vida sem questionar. Sair do conforto é ruim demais. Não causarei barraco. Por enquanto.
Mas que papo de fazer barraco é esse?? Eu vim é para colocar aqui um crônica muito engraçada, e que não podia ser de outra pessoa que não Luís Fernando Veríssimo. Eu já tinha comentado que eu cansei de ler os livros que eu tenho na estante. Pois é, dia desses eu baixei o "As vantagens de ser invisível" em inglês, que transforma o título em "The Perks of being a Wallflower". Estou gostando.
Voltando ao tópico, sempre que vou viajar, eu baixo livros de crônica. Na realidade não tem nada a ver isso porque eu não achei a crônica que eu queria postar, mas acabei descobrindo outra, tão engraçada quanto. Vamos lá.
" Festa de Criança "
" A professora começa a se arrepender de ter concordado (“Você é a única que tem temperamento para isto”) em dirigir a peça quando uma das fadinhas anuncia que precisa fazer xixi. É como um sinal. Todas as fadinhas decidem que precisam, urgentemente, fazer xixi.
- Está bem, mas só as fadinhas – diz a professora. – E uma de cada vez!
Mas as fadinhas vão em bando para o banheiro.
- Uma de cada vez! Uma de cada vez! E você, onde é que pensa que vai?
- Ao banheiro.
- Não vai não.
Mas tia.
- Em primeiro lugar, o banheiro já está cheio. Em segundo lugar, você não é fadinha, é caçador. Volte para o seu lugar.
Um pirata chega atrasado e com a notícia de que sua mãe não conseguiu terminar a capa. Serve a toalha?
- Não. Você vai ser o único de capa branca. É melhor tirar o tapa-olho e ficar de anão. Vai ser um pouco engraçado, oito anões, mas tudo bem. Porque você está chorando?
- Eu não quero ser anão.
- Então fica de lavrador.
- Posso ficar com o tapa-olho?
- Pode. Um lavrador de tapa-olho. Tudo bem.
- Tia, onde é que eu fico?
É uma margarida.
- Você fica ali.
A professora se dá conta de que as margaridas estão desorganizadas.
- Atenção, margaridas! Todas ali. Você não. Você é coelhinho.
- Mas o meu nome é margarida.
- Não interessa! Desculpe, a tia não quis gritar com você. Atenção, coelhinhos. Todos comigo. Margaridas ali, coelhinhos aqui. Lavradores daquele lado, árvores atrás. Arvore, tira o dedo do nariz. Onde é que estão as fadinhas? Que xixi mais demorado.
- Eu vou chamar.
- Fique onde está, lavrador. Uma das margaridas vai chamá-las.
- Já vou.
- Você não, Margarida! Você é coelhinho. Uma das margaridas. Você. Vá chamar as fadinhas. Piratas, fiquem quietos.
- Tia, o que é que eu sou? Eu esqueci o que eu sou.
- Você é o sol. Fica ali que depois a tia... Piratas, por favor!
As fadinhas começaram a voltar. Com problemas. Muitas se enredaram nos seus véus e não conseguem arrumá-los. Ajudam-se mutuamente, mas no seu nervosismo só pioraram a confusão.
- Borboletas, ajudem aqui – pede a professora.
Mas as borboletas não ouvem. As borboletas estão etéreas. As borboletas fazem poses, fazem esvoaçar seus próprios véus não ligam para o mundo. A professora, com a ajuda de um coelhinho amigo, de uma árvore e de um camponês, desembaraça os véus das fadinhas.
- Piratas, parem. O próximo que der um pontapé vai ser anão.
Desastre: quebrou uma ponta da lua.
- Como é que você conseguiu fazer isso? – perguntou a professora sorrindo, sentindo que o seu sorriso deve parecer demente.
- Foi ela!
A acusada é uma camponesa gorda que gosta de distribuir tapas entre os seus inferiores.
- Não tem remédio. Tira isso da cabeça e fica com os anões.
- E a minha Frase?
A professora tinha esquecido. A Lua tem uma fala.
- Quem diz a frase da Lua é, deixa eu ver... O relógio.
- Quem?
- O relógio. Cadê o relógio?
- Ele não veio.
- O quê?
- Está com caxumba.
- Ai, meu Deus. Sol, você vai ter que falar pela Lua. Sol, está me ouvindo?
- Eu?
- Você, sim senhor. Você sabe a fala da Lua?
- Me deu uma dor de barriga.
- Essa não é frase da Lua.
- Me deu mesmo, tia. Tenho que ir embora.
- Está bem, está bem. Quem diz a frase da Lua é você.
- Mas eu sou caçador.
- Eu sei que você é caçador! Mas diz a frase da Lua! E não quero discussão!
- Mas eu não sei a frase da Lua.
- Piratas, parem!
- Piratas, parem. Certo.
- Eu não estava falando com você. Piratas, de uma vez por todas...
A camponesa gorda resolve tomar a justiça nas mãos e dá um croque num pirata. A classe é unida e avança contra a camponesa, que recua, derrubando uma árvore. As borboletas esvoaçam. Os coelhinhos estão em polvorosa. A professora grita:
- Parem! Parem! A cortina vai abrir. Todos a seus lugares. Vai começar!
- Mas, tia, e a frase da Lua?
- “Boa noite, Sol”.
- Boa noite.
- Eu não estou falando com você!
- Eu não sou mais o Sol?
- É. Mas eu estava dizendo a frase da Lua. “Boa noite, Sol.”
- Boa noite, Sol. Boa noite, Sol. Não vou esquecer. Boa noite, Sol...
- Atenção, todo mundo! Piratas e anões nos bastidores. Quem fizer um barulho antes de entrar em cena, eu esgoelo. Coelhinhos nos seus lugares. Árvores, para trás. Fadinhas, aqui. Borboletas, esperem a deixa. Margaridas, no chão.
Todos se preparam.
- Você não, Margarida! Você é coelhinho!
Abre o pano. "
Veríssimo, Luís Fernando. Festa de criança. Para Gostar de Ler Júnior. São Paulo: Ática,
Espero que tenha gostado. As fotos vão vir... Um dia, claro.
xoxo <3 <3